Mark Tansey Monte Sainte Victoire

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O trabalho do historiador e do crítico de arte


Ao se tratar de uma história da crítica, buscam-se relações com o percurso passado da arte e arquitetura. E aqui, este é tratado como uma “virtualidade aberta[1]; quer dizer, considera que a atividade artística ou da crítica coloca no presente, uma episteme - dimensão que articula uma diversidade de historicidades entre si, segundo Michel Foucault[2]; e que para Giulio Carlo Argan coloca ao nível da cultura vivida, sedimentações, canalizações, ligações conscientes e inconscientes entre fenômenos do passado e do presente. Este “conjunto de experiências estratificadas e difusas”, definem forças, que agem em determinado campo[3].
[1]ARGAN, Giulio C. (1993). A História da Arte, in A História da Arte como História da Cidade. São Paulo: Martins Fontes, p. 67
[2]FOUCAULT, op. cit. p. 216
[3]ARGAN. op. cit. p. 70

O confronto de diversas historicidades no processo da história da arte, ao mesmo tempo em que reafirma a singularidade dos acontecimentos, aponta a não linearidade do processo histórico. Constrói a idéia de uma história que “recusa a ideologia do progresso, que recusa a continuidade e a identificação com um período dado[1].
Uma característica da história, segundo Michel de Certeau, que é o “gesto de dividir”[2] passado e presente, é contestada pela história da arte. Mas, o discurso histórico se escreve a partir dos interesses do presente, com limites dos instrumentos e dos projetos do presente, como diz Marina Waisman[3]. A ausência do corte entre passado e presente, não prescinde de ligar as idéias aos lugares, facultado pelo discurso.
Na perspectiva abordada, a história não é um mero relato dos acontecimentos, mas produto de discursos que se solidarizam, reagrupam e dispersam, de acordo com suas potencialidades de auto-afirmação, sustentação e difusão; operando uma atualização, ou inversamente, uma exclusão dos estratos nos quais se inscrevem os acontecimentos.

[1]Marc Sagnol, 1983 Apud. SANTAELLA. (1990) Arte e História, In V ENCONTRO DE HISTÓRIA DH-PUCSP. São Paulo, maio, 1990, p. 10
[2]CERTEAU, Michel de.(1982). A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense
[3]WAISMAN, Marina. (1990). El Interior de la História. Bogotá: Escala. p. 14


O trânsito de conceitos e temas no campo da arte e arquitetura ligam-se às relações entre o enunciável e o visível. O enunciado[1] e o objeto visível são duas formas que não tem a mesma formação[2]. O discurso faz incisões nas formas das coisas[3]; infiltrando seus enunciados nas lacunas formadas pelas condições do visível. Enunciado e objeto interagem e assimilam elementos entre si[4]. Mas esse movimento implica numa distância, na qual se mantém as especificidades de cada um. Essa propriedade do discurso exime o artista do estatuto de dar regras à arte, e desfaz ilusões da obra fazer-se por si. Pois,
"(...) a obra de arte é uma obra que nós fazemos para só depois sabermos mais completamente, como fizemos (...) com o tempo ela mostrará aquilo que no momento não mostra (...) Isto é para dizer que existe um olho na história"[5].
A história, como uma produção social de leituras cumulativas, apresenta a obra de arte como um modo de ver a vida social, sempre renovável de acordo com os instrumentos e as necessidades do presente. A história, segundo Flávio Motta, é “conseqüência da superposição dos sistemas de relação e os novos relacionamentos dos meios de produção”. Esta permite situar o trabalho artístico de modo não cristalizado, como trabalho criador, “que intensifica e aprofunda as relações entre os homens”[6].


[1]Enunciação é uma colocação da língua em funcionamento por um ato individual de utilização, enunciado é um objeto que individualiza um sujeito no seu campo de intervenção. Conceitos definidos partir dos textos de Foucault. op. cit.
[2]DELEUZE. Foucault, p. 71
[3]Idem. Ibidem. p. 75
[4]Idem. Ibidem, p. 75-6
[5]MOTTA, Flávio. (1973). Textos Informes, São Paulo: FAUUSP. p. 16
[6]Idem. Ibidem. p. 17-18
 

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