Mark Tansey Monte Sainte Victoire

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Pensamento, método e alucinação

Intuição / razão
Ratio latim –significa contar , reunir, separar, calcular. Logos, grego, mesmo significado. Razão significa pensar e falar ordenadamente, com medida, proporção, clareza e de modo compreensível aos outros. Intuição compreensão global e instantânea da realidade, de um fato ou objeto, insight  ‑
Intuição sensível, psicológica, lembranças, sensações, sentimentos, desejos, refere-se aos estados do sujeito enquanto ser individual e corporal: objetos e sujeitos específicos. Intuição intelectual: dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço, ao mesmo tempo. O todo é maior que as partes. Descartes, Penso, logo existo, não preciso demonstrar (Houaiss).
Na etimologia pensamento no dicionário Houaiss: rubrica filosofia atividade cognitiva, racional; conhecimento por conceitos: lat.tar. penso,as,ávi,átum,áre 'pensar, cogitar', no lat.cl. 'pesar, examinar, ponderar, considerar, meditar, ruminar, compensar, ressarcir; permutar, trocar, cambiar; satisfazer', v.freq. de pendère 'pesar, examinar, ponderar; estimar, prezar; ter de peso, pagar, dar em paga, expiar', do qual deriva por meio do rad. do supn. pensum; o lat.tar. pensáre parece ter sido um desaguadouro das acp. do lat. cogitáre 'pensar, meditar, ter um pensamento ou sentimento, formar uma idéia, conceber' e do lat. putáre 'calcular, examinar, apreciar, avaliar, estimar, prezar, julgar, crer'; cogitáre 'pensar' é cultismo, sua f. divg. vulgar é cuidar 'tratar de; pensar', o lat. putáre não veio para o port. a não ser algum der. seu como o adj. putativo; da convivência entre cogitáre e pensáre terá surgido a expansão semântica de pensáre para as acp. 'cuidar de, tratar de' comuns ao port. (sXIII), ao esp. (sXIV), cat. (sXIV) e fr. (sXII); a propósito do fr. panser 'cuidar de', deve-se ter em mente que até o sXVIII encontra-se um que outro registro da grafia penser (a grafia atual é o modo como os franceses estabeleceram a distinção entre as duas áreas semânticas de pensar); Nascentes, comentando a ampliação semântica de pensar para 'cuidar de, tratar de', admite que talvez tenha havido a infl. do v. cuidar, do lat. cogitáre; por sua vez, o TLF, ao comentar a mesma expansão semântica do v. penser 'exercer atividade mental' para 'cuidar de', admite a possibilidade da infl. de expr. como penser de 'tomar cuidado de, preocupar-se com' (...). E ainda, a palavra reflexão: etimologia: lat.tar. refléxìo,ónis, de refléxum, supn. de reflectère 'refletir', de flectère 'curvar, dobrar, vergar'; na acp. 'concentração do espírito sobre si próprio' (...).
Já sentimento: etimologia: sentir + -mento; AGC registra um lat.medv. sentimentum; JM vê infl. do fr. sentiment (1190 sob a f. sentement) 'faculdade de receber as impressões físicas, sensação, conhecimento, fato de saber qualquer coisa', (1279) 'todo fenômeno da vida afetiva, emoção', (1314) 'sentimento', (1381) 'opinião', (c1390) 'bom senso', refeito do fr.ant. sentement que sobreviveu até o sXVI (...) (Houaiss).

Essa idéia de pendência Giorgio Agamben explora. Agamben diz citando Sto Agostinho: O desejo que há na procura procede de quem busca e, de alguma maneira, permanece suspenso, até repousar na união com o objeto enfim encontrado. Esta sentença de Sto Agostinho caracteriza o processo de conhecimento. Mas que coisa está em suspenso no pensamento? pergunta Agamben que responde: é a voz, pois linguagem é e não é nossa voz. A defasagem (Agamben diz este abismo) entre linguagem e voz é que chamamos mundo .
Giorgo Agamben diz que na língua italiana a palavra pensamento tem por origem o significado de angústia, de ímpeto ansioso, que se encontra ainda na expressão familiar: stare in pensiero (estar atormentado). O verbo latino pendere, de onde deriva a palavra nas línguas romanas, significa estar suspenso. Agamben continua:
"Então, a fuga, a pendência da voz na linguagem deve ter fim. Podemos deixar de ter a linguagem, a voz, em suspensão. Se a voz jamais foi, se o pensamento é pensamento da voz, ele não tem mais nada a pensar. O pensamento cumprido não tem mais pensamento." (...)
"Do termo latino que, por séculos, designou o pensamento, cogitare, na nossa língua, restou apenas um traço na palavra tracotanza (Arrogância, prepotência, insolência, atrevimento, petulância, presunção). Ainda no século XIV, coto, cuitanza, queria dizer: pensamento. Através do provençal oltracuidansa, tracotanza provém do latino ultracogitare: exceder, passar o limite do pensamento, sobrepensar, spensare." O latim "cogere" dá nossos verbos cogitar e excogitar, que significam pensar, inventar, refletir, idear, imaginar, cogitar traz uma raiz de prepotência, presunção. Mesmo cogitar em sua etimologia (Houaiss) [lat. cogìto,as,ávi,átum,áre '] é "agitar no espírito, remoer no pensamento", pensar, meditar, projetar, preparar'; [divg. vulg. de cogitar; ver cuid-; f.hist. (sXIV) coydar, (sXIV )cudar, (sXIV) cujdar, (sXV) quidar]. Assim, por outro lado, a origem do verbo cuidar é proveniente também do verbo latino cogitāre, cujo significado básico era pensar, meditar.
Cogito ergo sum, me dou conta de mim quando penso, só quando penso? O problema do método para assegurar, direcionar, assegurar um bom fim ao processo, delinear conceitos. Estes, por sua vez, significam tanto a ação de conter como o ato de receber, a germinação, o fruto, o feto, o pensamento.
Conceito, no dicionário é definido como representação de idéias por meio de suas características gerais, é uma ordenação e um corte no conhecimento (fil.). No entanto:
"Conceito deriva do latim conceptum e significa tanto pensamento e idéia quanto fruto ou feto. Concipere engloba tanto o significado mais comum de gerar e conceber quanto as ações de reunir, conter, recolher, absorver, fecundar, exprimir ou apreender espiritualmente alguma coisa. Como no grego logos, no qual se radicarão por exemplo "leitura" (legere) e "legume", a atividade mental de conceber é metáfora da atividade agrícola de colher algo que é oferecido pelo mundo e apropriado pelo espírito ou pela nossa vida prática (Carlos Brandão). Essa origem etimológica não é apenas uma abordagem erudita mas aponta para a ligação entre a teoria e a praxis, entre a linguagem e o mundo, entre o conceito e a existência cotidiana, entre a atividade abstrata do pensamento e o nosso modo concreto de estar e se relacionar com o mundo. (Carlos Brandão)".
Por uma via totalmente antagônica, Prioste argumenta "a contenção do conceitual pode ser entendida como contenda ou o encerrar. O conceituado cerra a passagem de qualquer diversidade de sentido que se diferencie do centro de concepção da ação de conter. Então a recepção, como fundamento para que frutifique o motivo do pensar, se estabelece por um contender contra o que contém aquilo que não consolide o saber como um conhecer seguro, sólido e sóbrio. A cautela e precaução do conceituar, entretanto, terminam por transformar o pensamento em um acervo de certezas. " (Prioste). Já alienar (afastar) da ratio (cálculo, conta e registro) ou um metódico e seqüencial cogitar definem-se como delírio. Alucin(o)- é um elemento de composição derivante do grego alúo , estar fora de si, perplexo, vaguear, diz Prioste referindo-se ao poeta Manuel de Barros.
"Poeta é um ente que lambe as palavras e depois se alucina. No osso da fala dos loucos há lírios"
"Poema é o lugar onde a gente pode afirmar que o delírio é uma sensatez " .

A tradução desconcertante aludida por Anne Cauquelin (em Teorias da Arte) realizada pelos neoplatonicos, repetida pelo positivismo no início referenciou seus processos compositivos na poética (aristotélica), depois no positivismo, cientificismo buscava ordem, a teoria (seqüência de proposições), no entanto, não vaguear nem delirar. Referendar as perguntas de CAUQUELIN A arte não é incompatível com um tratamento científico? Não é melhor ignorar essas teorias?  Aonde foi parar a poesia agora (qual rumo? deriva?), agora que já não temos tantas certezas, talvez devêssemos nos perguntar?

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